O dia estava a terminar e, de repente, parece que um enorme manto de penumbra acelerou o processo e a noite estendeu-se, sobre o bairro, muito vasta e mansa.
A minha mãe chamava-me do jardim que ficava lá ao fundo e eu tinha que atravessar um corredor de paredes altas. O chão estava húmido (talvez tivesse chovido) e daí que fosse um pouco difícil correr através dele. No entanto, a minha mãe permanecia inclinada e com os braços abertos para me receber naquele sorriso infinito. E não se podendo inclinar mais, ajoelhou-se para ficar sensivelmente da minha altura, mantendo os braços abertos e as mãos em forma de chamamento. E o sorriso, apesar do desconforto do percurso que eu tinha que fazer, aquecia-me a alma como uma fogueira aquece uma noite fria num acampamento. Mas as paredes do corredor começaram a afunilar na direcção de minha mãe. E agora afunilavam mais rápidamente, de tal forma que o movimento me estava a causar enjoos, falta de ar e de força nas pernas, eu era criança e, antes que as paredes formassem um ângulo agudo e me impedissem de me aconchegar nos braços dela, acordei.
Hoje de manhã atravessei o dito corredor, muito perto daqui, e cheguei ao jardim lá para os lados da EMARP. E tudo me pareceu renovado: o ar, os arbustos, as flores como se tivessem sido cuidados pelas mãos de minha mãe.